A metáfora do pintor em Platão, República 10
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Resumen
A elaborada construção da República progride, passo a passo, até uma conclusão final, irrefutável para os interlocutores de Sócrates, na edificação da cidade ideal: a mimese e, em particular, o teatro trágico não têm lugar nessa cidade, pelo seu vazio ontológico e pela ilusão e consequente desvio da razão. Todavia, o Sócrates platónico argumenta com frequente recurso a metáforas, a alegorias. A própria estruturação do livro 1 sugere, por antecipação poética, o curso da ‘acção’ dialógica. Ou seja: o leitor ou ouvinte vai apreciando como o Filósofo recorre àquilo que rejeita, rendido ao seu encanto e consciente da sua carga persuasiva. Proponho-me, pois, em matéria de compreensão de como o teatro (a tragédia) é excluído da cidade perfeita, seguir o fio da discussão e os passos de argumentação que parecem conter deliberado vício e contradição para se chegar à eliminação da arte mimética (versus teatro) da pólis perfeita, apoiada num argumento de analogia decisivo: o da desvalorização ontológica da pintura, como mimese de aparências. Em todo o percurso dialógico, porém, se o poder da persuasão decorre do apelo à inteligência (noesis) e ao entendimento (dianoia), pela lógica argumentativa, decorre, também, da força da sugestão de recursos poéticos. É, afinal, este mesmo processo de persuasão que leva Sócrates a admitir na cidade a retórica epidíctica da poesia de encómio a varões ilustres e a heróis. Ora esse constitui o espaço paradoxalmente aberto àquilo, precisamente, para que Sócrates alerta como perigo: o encanto do impreciso, que escapa à avaliação judiciosa. Eis o caso e a função do recurso à metáfora desenvolvida da pintura, preparada a desvalorização desta arte pelo recurso ao argumento comparativo do espelho. Afinal, a imagética artística deleita e reforça a adesão do leitor à proposta platónica, numa dinâmica que facilmente se condensa em delectare, mouere, docere.
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